Observando os conceitos de acampamento e tenda entre o povo de Israel, vemos que esta é armada por Moisés "fora do acampamento, longe do acampamento". Como lugar de reunião e de oração, não pode confundir-se com o ruído e a euforia cotidianos. Tampouco pode situar-se muito longe do campo onde a vida sofre, luta e se debate. Tenda e acampamento se integram, se interpelam, se questionam, se complementam - mas não se mesclam. A tenda onde Deus se faz presente pela simbologia de "uma coluna de nuvem parada à sua entrada" deve permanecer suficientemente perto do acampamento, para que todo o povo pudesse levantar-se e prosternar-se enquanto "Senhor falava com Moisés face a face, como um homem fala com outro". Ao mesmo tempo, porém, a tenda deveria estar suficientemente afastada do acampamento, como ponto de referência que, sem se misturar ao burburinho diário, induz a um silêncio respeitoso frente à presença do Senhor.
Aqui também, como no episódio da sarça ardente, Deus não se deixa manipular. Encontra-se presente e ausente ao mesmo tempo. A proximidade e a distância da tenda em relação ao acampamento expressam, simultaneamente, essa presença que se ausenta, ou essa ausência que se faz presente. O mistério divino não se enquadra em nossos esquemas mentais, não se restringe ao programa de uma organização ou partido, não se esgota nas formulações históricas e culturais. A utopia da Terra Prometida rompe todas as fronteiras possíveis e imagináveis. O projeto de Deus não cabe nos limites da racionalidade humana. Por outra parte, esse mesmo projeto não está desvinculado dos desejos e temores que habitam e dilaceram a alma humana, lá na convivência do acampamento. É um projeto que começa no acampamento, isto é, no aqui e agora da história, mas ultrapassa seus limites, como uma utopia que sempre renova a ordem econômica, política, social e cultural de cada nação e de toda a humanidade.
Por isso a tenda. É nela que se localiza a arca do Senhor. Tenda é casa em movimento, permanentemente a caminho. Casa que se faz, desfaz e refaz a cada curva da estrada. Além disso, é abrigo aberto ao caminheiro que busca refúgio e descanso, lugar de acolhida. O contrário da tenda é a fortaleza, a casa cerrada e cercada por muros, cães e sistemas de segurança. Impenetrável aos peregrinos que necessitam recuperar suas energias para retomar a estrada. Deus está na tenda, paira sobre ela em forma de coluna de nuvem, oferece acolhimento e repouso. Mas, quando pensamos que o temos à mão, Ele se ausenta, dá um passo à frente, convidando-nos a desarmar a tenda e enfrentar o caminho no meio do deserto. Não é um Deus dos mortos e do passado, mas um Deus que a partir do futuro irrompe no presente, abrindo alternativas sempre distintas às encruzilhadas históricas.
Também não é um Deus que rejeita a obra humana. Ao contrário, caminha secretamente nas entrelinhas da história para dar-lhe um rumo e um sentido mais profundo, sem interferir na liberdade pessoal ou coletiva. Na busca humana de "um novo céu e uma nova terra", Senhor assume a cidade terrestre, fazendo dela "a tenda de Deus com os homens" para caminhar em direção à cidade celeste, onde "não haverá mais morte, nem luto, nem clamor e nem dor" (Ap 21. 1-8).
A casa-fortaleza tem raízes no chão. Aferra-se obstinadamente ao terreno conquistado. Guarda tesouros que a ferrugem e a traça corrompem, os ladrões podem roubar (Mt 6.19-21). A casa-tenda, ao contrário, em lugar de raízes tem pés. Pés que podem se converter em asas. No primeiro caso, temos o rico estabelecido, com o coração prisioneiro do próprio tesouro, "semelhante ao gado que se abate", como diz o salmista (Sl 49). No segundo caso, transparece a figura do peregrino. De tanto caminhar, aprende a depurar e purificar a bagagem, bem como a própria alma. Em vez de acumular riquezas que o prendem e escravizam à terra e à história, cria laços, costura rede de relações, cultiva amizades - bens que ninguém rouba e não ocupam espaço. Por isso pode caminhar e voar livremente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário